Discurso da Encarregada de Negócios Herro Mustafa na Câmara de Comércio Americana
Boa tarde a todos.
É óptimo estar aqui hoje. A Câmara de Comércio é uma instituição da maior importância em todos os países do mundo. Na minha carreira de diplomata tenho sido uma defensora do trabalho das nossas câmaras de comércio. Sois os líderes de opinião dentro da comunidade empresarial americana em Portugal e o vosso trabalho reforça as relações económicas entre Portugal e os EUA.
Gostaria de começar por agradecer à Sofia Tenreiro pelo convite para estar aqui. O papel da Sofia à frente da Câmara de Comércio é muito relevante sobretudo no que se refere à nossa colaboração em muitas iniciativas. A Sofia tem uma energia contagiante e estou certa de que, sob a sua direcção, a Câmara vai ter muito sucesso.
Os meus agradecimentos também à Graça Didier que está por trás de tantas iniciativas da Câmara de Comércio, levando à prática grandes ideias.
Agradeço à AON, ao Millennium e à EDP pelo generoso patrocínio deste evento e ao Marriott por nos acolher.
E, claro, estou grata a todos vocês por terem vindo para ouvir o que tenho a dizer sobre as relações transatlânticas após os primeiros 100 dias da administração Trump. Espero que no final do meu discurso tenhamos um diálogo.
Para contextualizar a minha intervenção, gostaria de vos dar a conhecer um pouco do meu percurso no governo americano. Trabalhei em administrações republicanas e democratas e passei por várias transições. Estive no Conselho Nacional de Segurança, com o Presidente George W. Bush, durante dois anos e na Casa Branca de Obama durante mais de dois anos. Nos dois casos ocupei-me da política para o Médio Oriente e Sul da Ásia. As ideias que hoje vou partilhar vêm do facto de eu já ter passado por outros “primeiros 100 dias” e, por conseguinte, posso dar-vos essa perspectiva única.
Antes da tomada de posse
A última vez que me pronunciei sobre as políticas da Administração Trump foi depois da eleição e antes da tomada de posse, na conferência de 7 de Dezembro com o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa. Nessa altura fiz algumas afirmações que vale a pena repetir:
- Disse que seria importante esperar para ver exactamente como seria a presidência Trump na prática, que seria importante ver quais as medidas tomadas em vez de tentar especular o que poderia acontecer com base em notícias e discursos de campanha. Referi que a realidade é que, mesmo quando um presidente estabelece um objectivo político, e isto aplica-se a qualquer presidente, essa política 1) não é implementada de um dia para o outro e 2) não será isenta de desafios.
- É importante ter o gabinete completo, incluindo ao nível de adjuntos e dois níveis abaixo, pois são estes os negociadores e fazedores de decisões tanto no aspecto táctico como estratégico. No nosso sistema os adjuntos são actores poderosos. Estamos com o gabinete quase completo e vamo-nos agora centrar noutras posições chave. Em Dezembro preconizei que isto iria levar tempo porque temos um presidente sem experiência a nível de governo ou serviço público.
- Como prova a realidade global, a Administração vai provavelmente responder de forma pragmática. As realidades globais determinaram as políticas e prioridades das administrações de Bush e Obama e forçaram muitas vezes a desvios das promessas de campanha para soluções do mundo real. Vejam, por exemplo, a política para a Síria na Administração Obama ou como tentámos muitas vezes no passado “restabelecer” a nossa relação com a Rússia. Estas administrações receberam orientação dos seus principais conselheiros, é um facto, mas também de estruturas burocráticas e políticas mais profundas dos EUA que, desde o fim da II Guerra Mundial, têm ditado a nossa política externa.
Foi isto que eu disse antes da tomada de posse.
A Política depois da tomada de posse
O que temos visto desde a tomada de posse é maior clareza em muitas das questões de política externa. Não vou conseguir abordar todos os tópicos nesta intervenção, mas quero falar daqueles que mais impacto têm aqui em Portugal. Quero destacar especificamente a nossa política em relação à NATO e à UE, sobretudo porque desde há 100 dias que muita gente pôs em causa o nosso compromisso com ambas. E também a Rússia e a Ucrânia, comércio e energia e o contra terrorismo. Se me tivessem perguntado há 100 dias como estávamos nestas políticas, seria incapaz de dar uma resposta clara. Agora sou.
NATO: Este é um assunto que espero todos vocês encarem como o pilar da nossa relação transatlântica. O Presidente Trump foi bem claro ao afirmar que os Estados Unidos continuam cem por cento empenhados na NATO. O nosso compromisso com uma Aliança que nasceu dos laços da II Guerra Mundial e da Guerra Fria é inabalável. Como disse o Presidente Trump por ocasião da visita do Secretário Geral da NATO Stoltenberg à Casa Branca em 12 de Abril, esta Aliança tem sido o baluarte da paz e segurança internacional ao longo destes quase 70 anos. E no fim deste mês, no âmbito da sua primeira viagem internacional, o Presidente vai participar na Cimeira da NATO em Bruxelas.
Cada geração trabalhou para adaptar a NATO aos desafios do seu tempo e estamos a trabalhar com os nossos aliados da NATO para fazer precisamente isso. E, para podermos enfrentar esses desafios, vamos continuar a apelar aos nossos Aliados para que respeitem o compromisso assumido na Cimeira do País de Gales de 2014 e reafirmado na Cimeira da Varsóvia de 2016 de gastar dois por cento do seu produto nacional bruto em defesa até 2024. Agora mais do que nunca, o mundo precisa da força e liderança da NATO e é por isso que é necessário que haja um progresso imediato e contínuo no empenho de todos os aliados da NATO na nossa defesa comum. A NATO e a sua capacidade para lidar com os desafios de segurança de hoje de modo efectivo e sustentável é claramente uma prioridade de topo para a Administração Trump.
É igualmente importante referir que o Secretário Mattis compreende a importância da diplomacia. Nunca assistimos a uma relação tão próxima entre o Departamento de Estado e o Departamento de Defesa como hoje.
UE: A União Europeia também continua a ser um importante parceiro para os Estados Unidos com a Administração Trump. Depois do seu encontro com Angela Merkel, o Presidente Trump afirmou que a UE tinha “feito um bom trabalho” ao manter-se unida com o movimento Brexit. Muito se tem dito sobre o comentário que ele achava que outros países iriam fazer o mesmo que o Reino Unido, mas ele também afirmou que acreditava em alianças e parcerias. “Acredito em alianças. Acredito em relações. E acredito em parcerias.” A relação entre os EUA e a UE é demasiado robusta em muitas vertentes para abarcar mudanças de grande escala. Temos um grande fluxo de comércio e investimento entre os nossos países, laços familiares e sociais, elos que nos ligam de muito mais formas que muitas outras áreas regionais do mundo.
Rússia e Ucrânia: Aqui está outra área em que muita gente na Europa se interrogava se a Administração iria ficar tão próxima da Rússia que fechava os olhos ao que se passa na Ucrânia e noutros locais na periferia da Rússia. Como afirmou o Secretário Tillerson no fim do seu encontro com o Ministro dos Negócios Estrangeiros Lavrov, em Moscovo, actualmente é baixo o nível de confiança entre os dois países. Mas na reunião o Secretário de Estado e o Ministro dos Negócios Estrangeiros falaram de abordagens para melhorar os canais de comunicação, nomeadamente pela criação de um grupo de trabalho para a estabilização das relações.
Nos pontos em que não concordamos com a Rússia, os Estados Unidos vão continuar a defender os interesses e valores da América, os nossos aliados e os nossos parceiros da Europa do Sul e Europa Central que foram sujeitos a uma sofisticada campanha de subversão e desinformação. Como o Presidente, o Secretário Tillerson e a Embaixadora Haley deixaram bem claro, esperamos que a Rússia cumpra na íntegra o compromisso assumido no acordo de Minsk que inclui um cessar-fogo real e duradouro, a retirada de todo o armamento pesado e a retirada das tropas do leste da Ucrânia. Ainda hoje a Rússia continua a armar, treinar, comandar e a lutar ao lado dos separatistas da Ucrânia de leste.
A Ucrânia também tem de cumprir a sua parte do acordo. Os Estados Unidos dão todo o apoio aos esforços de anticorrupção e de reforma do país ao abrigo do programa do FMI. A Ucrânia já registou progressos na implementação de aspectos políticos do acordo de Minsk, incluindo a aprovação de leis de amnistia e estatuto especial.
Comércio e Investimento: O Presidente Trump faz questão de garantir que os americanos têm emprego e que as empresas americanas não ficam sujeitas a práticas de comércio injustas. Foi muito claro quando disse que os Estados Unidos abandonariam a Parceria Trans-Pacífica (TPP) para garantir que qualquer acordo comercial corrente ou futuro defende os interesses dos trabalhadores e do povo americano.
Quanto à NAFTA, o Presidente Trump está decidido a renegociar o acordo. No entanto, numa declaração de 26 de Abril, a Casa Branca fez saber que “o Presidente ‘concordou em não pôr termo ao acordo nesta altura e os líderes [referindo-se ao Presidente mexicano Peña Nieto e Primeiro Ministro canadiano Justin Trudeau] concordaram em avançar, segundo os procedimentos exigidos pelo seu país, para permitir a renegociação do acordo NAFTA em benefício dos três países.’”
Tem havido muita especulação sobre a Parceria Transatlântica sobre Comércio e Investimento (sigla em inglês, T-TIP). Chamo a atenção que o T-TIP não foi posto de lado. Um acordo com a UE é na essência um acordo comercial bilateral, ao contrário do TPP que é multilateral. A UE tem competência no comércio e o nosso parceiro de negociação é a Comissão Europeia. Há que rever os assuntos e preocupações que os dois lados levantaram e avaliar se há vontade e visão para avançar. Não sendo uma prioridade de topo, há dos dois lados abertura para reatar conversações sobre o T-TIP quando ambas as partes estiverem prontas. Estamos a concluir a nossa transição administrativa e a Europa está com uma série de actos eleitorais muito importantes, portanto, talvez lá para o Outono, possamos ter uma melhor noção das coisas. Mesmo assim, a Administração diz que é necessário estabelecer prioridades sobre onde começar conversações comerciais, se com parceiros como a UE, Japão ou China. Os parceiros que demonstrarem mais vontade de rapidamente chegar a um acordo poderão ser aqueles com quem vamos começar. A renegociação do NAFTA também vai ser uma prioridade.
Energia: Nos EUA está em curso uma revolução energética. Iremos ser no futuro um dos maiores exportadores de gás do mundo. Estamos a explorar e a desenvolver novas oportunidades de cooperação em Portugal e na Europa. Em Abril de 2016, partiu dos EUA o primeiro carregamento de gás natural liquefeito (LNG) para a Europa que atracou no Porto de Sines. Esse carregamento, apesar de não ter sido muito publicitado, marcou um potencial ponto de viragem para a segurança energética da Europa e para as opções energéticas regionais. No mês passado uma grande delegação bipartidária do Congresso veio a Portugal só para ver a questão da segurança energética. A Península Ibérica tem mais de um terço da capacidade de importação de LNG da Europa, mas as opções para transportar depois o gás para outros mercados são limitadas. Com as novas tecnologias, que tornam mais baratos e mais rápidos de construir os terminais flutuantes de Gás Natural Liquefeito, os preços do transporte estão a descer e Portugal pode tornar-se uma porta de entrada para a Europa e para África, à medida que as exportações [de GNL norte-americano] aumentam exponencialmente nos próximos anos. Mesmo que o papel das renováveis seja cada vez mais relevante, o gás natural é a ponte para o futuro. Queremos trabalhar com Portugal para trazer para a Europa e África opções de energia mais limpa e mais barata que aumentem a segurança energética colectiva.
Outra área em que esta Administração tem sido muito clara é o seu compromisso com o contra terrorismo, um objectivo que diz muito à Europa e a todo o mundo.
Relações Bilaterais: Estamos nas vésperas do 37º Encontro da Comissão Bilateral Permanente (sigla em inglês, SBC) que vai ter lugar a 10 e 11 de Maio, em Washington, e por isso acho que faz sentido realçar as nossas fortes relações bilaterais. Enquanto os encontros anteriores da SBC estiveram fortemente centrados na Base Aérea das Lajes nos Açores, agora vemos que a agenda está a ser mais alargada, cobrindo nomeadamente questões de carácter político, económico e de segurança que reflectem a nossa ampla e profunda cooperação a muitos níveis. O foco desta SBC em particular vai ser a cooperação Portugal-EUA no Atlântico e vai contar com discussões sobre cooperação política e diplomática, segurança energética, promoção da economia azul, investigação dos oceanos, o Centro AIR, cooperação na defesa e segurança e, claro, Lajes e os Açores.
Muitos dos temas da nossa agenda bilateral têm um foco económico pois as nossas relações económicas e comerciais estão a crescer. Cresce o número de empresas americanas. Cresce o investimento americano e o nosso comércio está em expansão. Estes investimentos são importantes exemplos que mostram a confiança que os investidores americanos têm em Portugal.
Portugal é líder europeu em muitas áreas. Estabilidade política, adoro o facto de outros países europeus e Harvard estarem a estudar o conceito “geringonça”. Melhorar a economia, recursos naturais – o mais importante dos quais o vizinho a ocidente, o Atlântico. Portugal vai continuar na linha da frente em termos de energia renovável, inovação e empreendedorismo. E uma vontade de fazer mais no plano internacional. Estou convencida que vai continuar a ser um bom ano para Portugal e as relações bilaterais vão tornar-se ainda mais fortes.
Relações Transatlânticas: Vou terminar voltando às relações transatlânticas, em que espero que estejam seguros de que, passados os primeiros 100 dias desta nova Administração, o nosso compromisso se mantém.
O Presidente Trump e a sua equipa têm feito esforços para estabelecer e manter relações fortes com aliados e parceiros essenciais e criar novas relações que permitam que os Estados Unidos encontrem novas áreas de cooperação e para tratar de assuntos prementes da actualidade ou do futuro. Promoveu 17 encontros bilaterais e fez 70 chamadas telefónicas a 38 líderes mundiais.
O Presidente Trump faz uma análise de todas as relações existentes, avaliando como melhorar essas relações, bilaterais e multilaterais, incluindo sectores de segurança, política e economia. Em todos os desafios e oportunidades enfrentados pela Administração do Presidente Trump, a Europa e os nossos parceiros europeus continuam a ser os nossos parceiros de eleição. Repito que a Europa e os nossos parceiros europeus continuam a ser os nossos parceiros de eleição. As relações transatlânticas estão robustas e abrangem uma vasta área – paz e segurança internacional, desafios sociais, valores e interesses comuns e fortes laços económicos na energia e comércio e investimento.
Esta estreita aliança política, económica e estratégica assenta em séculos de história comum e imigração, através de guerras e negociações económicas, intercâmbio educacional e turismo e simplesmente amizade entre os nossos povos. Com a Administração Trump os Estados Unidos mantêm o compromisso de manter e expandir as nossas relações e parcerias transatlânticas, salvaguardando os interesses dos EUA ao mesmo tempo que desenvolvemos as nossas parcerias de modo a fazer ainda mais para lidar com as prioridades de hoje.
Na Embaixada Americana em Lisboa somos uma equipa de 200 locais e americanos. Vamos continuar a construir pontes de entendimento e ligação através da arte e da cultura, economia e ciência, educação e tecnologia. E através de outras iniciativas como a Economia Azul, diplomacia culinária e maior cooperação nas áreas militar e de segurança. Os EUA e Portugal estão ligados por laços muito profundos e vamos continuar a defender o nosso trabalho aqui.
E volto ao comentário que fiz durante a conferência de Dezembro. Este é o melhor tempo de Portugal no mapa com a Administração Trump. A Administração Trump ainda está a definir a agenda em muitos aspectos, nomeadamente na frente comercial bilateral com diversos países. As prioridades de Portugal e as oportunidades económicas e comerciais – tudo isto deve ser comunicado por vocês a Washington, partilhando prioridades com o vosso governo e a vossa Embaixada em Washington e, claro, falando connosco na Embaixada. Comunicamos o que estamos a fazer aqui e aquilo que identificamos como oportunidades. Mas queremos saber o que pensam. Vou aguardar que me enviem questões e entremos num saudável diálogo e espero ter ainda mais para levar para a próxima reunião da SBC na próxima semana em Washington.
Mais uma vez, obrigada por terem vindo. E obrigada novamente a Câmara de Comércio Americana pela parceria, aos patrocinadores pelo apoio e a todos pela presença!