Relações EUA-Portugal: Passado, Presente e Futuro

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Boa tarde! Os meus agradecimentos ao Presidente Nuno Botelho pelas suas palavras e à Associação Comercial do Porto pela realização deste magnífico evento.

É um prazer estar de volta a esta linda região do Porto, sem dúvida uma das minhas preferidas em Portugal. Ao longo de quase três anos foi uma honra representar o Presidente Obama e os Estados Unidos em Portugal. Como o meu mandato está a chegar ao fim, acho que fazia todo o sentido vir aqui dar um dos meus últimos discursos na medida em que muito da história do Porto ilustra a história e o potencial das relações entre os Estados Unidos e Portugal.

Antes de começar, deixem-me agradecer a muitos presidentes de câmara da região aqui presentes pelo extraordinário apoio manifestado nas visitas que aqui fiz. É para mim uma honra ter muitos de vós como amigos. Uma palavra de apreço igualmente a Isabel Gil, Reitora da Universidade Católica, Paulo Rangel, Membro do Parlamento Europeu, Presidente da Câmara de Vila Nova de Famalicão – Paulo Cunha, Presidente da Câmara de Gouveia – Luis Tadeu Marques, Presidente da Câmara de  Bragança – Hernâni Dias e Presidente da Câmara de Valongo – José Manuel Ribeiro, e Mário Ferreira, CEO da Douro Azul. Também vocês foram meus amigos e conselheiros durante a minha estadia em Portugal, o meu um sincero obrigado a cada um de vocês.

Estamos no nono dia de 2017 e se calhar, tal como eu, também vocês continuam a pensar nas resoluções para o Novo Ano. Para aqueles que abusaram de francesinhas e tripas durante a época natalícia – ou, no meu caso, cerveja e cheeseburgers – devem ser mais do tipo cardio, cross fit e contagem de calorias. Tudo bem. Mas no topo da minha lista está um conjunto diferente de Cs com mais longevidade – no meu caso pelo menos – que qualquer dieta ou exercício físico.

Compromisso. Cooperação. Conexão. São estas as matérias-primas que ligaram os Estados Unidos e Portugal durante séculos e irão sustentar os nossos laços em décadas futuras. O nosso relacionamento político, económico e estratégico define-se por um duradouro Compromisso. Desenvolve-se pela Cooperação na defesa de interesses comuns num vasto espectro de questões. E depende da Conexão da próxima geração de inovadores, líderes e fazedores que vão criar oportunidades para ambos os países melhor responderem aos desafios complexos e globais que enfrentamos.

Compromisso. Cooperação. Conexão. São estes os alicerces das relações EUA-Portugal, no passado e no presente. São estes elementos que mantêm unidos os inabaláveis laços que unem os nossos povos.

A nossa amizade remonta ao próprio nascimento dos Estados Unidos quando Portugal esteve entre os primeiros países a reconhecer a nossa independência. Os nossos pais fundadores brindaram na Declaração da Independência com vinho da Madeira – infelizmente não foi Porto – e basta ver que Ponta Delgada é o mais antigo consulado americano no mundo. Os Estados Unidos e Portugal foram, são e continuarão a ser fortes aliados.

Mas uma grande amizade é aquela que mostra o que de melhor há em nós, aquela que brilha quando os tempos são difíceis, não quando são felizes. A aliança EUA-Portugal não é estranha à adversidade e, tal como o Porto é conhecido como cidade invicta, acho que entre os Estados Unidos e Portugal há uma amizade invicta. Graças a um compromisso sério, a nossa amizade tem florescido mesmo em tempos de grandes desafios.

Em 1957, quando houve a erupção do vulcão dos Capelinhos na ilha do Faial, nos Açores, que obrigou à evacuação em massa, os Estados Unidos estiveram lá. Ao saber da tragédia, um jovem senador, John F. Kennedy, de Massachusetts, passou à acção. Ao lado do senador de Rhode Island, John Pastore, fez aprovar no Congresso a Lei para os Refugiados Açorianos. Esta simples medida desencadeou uma série de eventos que levaram à emigração de 175.000 portugueses para os Estados Unidos, contribuindo para uma melhoria da qualidade de vida, mais oportunidade de emprego e fortalecimento dos laços culturais com os Estados Unidos que continuam até hoje a pagar dividendos.

No dia 1 de Janeiro de 1980, um sismo de magnitude 7.2 abalou diversas ilhas dos Açores, destruindo 70 por cento das habitações na ilha Terceira, matando e ferindo mais de 400 e deixando sem casa 21.000 pessoas. Nessas horas difíceis, os Estados Unidos também estiveram presentes. Imediatamente após o sismo, o Brigadeiro General Richard Drury e a sua equipa nas Lajes formaram grupos de pronto socorro. Procuraram sobreviventes entre os escombros, limparam estradas e distribuíram alimentos e medicamentos juntamente com a Força Aérea Portuguesa. O ginásio das Lajes tornou-se um abrigo temporário e a messe serviu mais de 1.800 refeições quentes às vítimas. Em Lisboa, o Embaixador Richard Bloomfield garantiu a assistência de socorro imediata para a instalação de mais abrigos. E de todo o território americano, de Rhode Island à Califórnia, chegaram donativos recolhidos pelos americanos.

E no Verão passado, quando os fogos atingiram o continente e a Madeira, os Estados Unidos estiveram lá. A Embaixada contribuiu com fundos para a Cáritas e Cruz Vermelha para a compra de forragem para os animais e equipamento agrícola para os agricultores do Norte do país cujas propriedades ficaram reduzidas a cinza. Ao ter conhecimento, através da Cruz Vermelha, que as vítimas dos incêndios tinham falta de alimentos, o pessoal da Embaixada, americanos e portugueses, recolheram aproximadamente 1,2 toneladas de arroz, leite, massas e cobertores que entregaram num centro de distribuição próximo.

Vendo as relações bilaterais pela lente da história, uma coisa é certa – temos sempre sido amigos mútuos e empenhados.

Mas alguns poderão perguntar se isto se alterou. Podem estar preocupados que as recentes eleições presidenciais e a mudança na administração possam enfraquecer o relacionamento dos Estados Unidos com a Europa. Se calhar leram nos media que os interesses dos Estados Unidos estão focados noutro ponto. Ou então viram cabeçalhos alegando que estamos a abandonar a nossa presença nas Lajes e a permitir que uma potência externa tome o nosso lugar. Permitam-me que vos diga que todas essas afirmações, sem excepção, não são verdade.

A aliança Portugal-EUA passou por eventos catastróficos e cada vez ficou mais forte graças ao nosso compromisso mútuo de vencer os desafios. O nosso esforço conjunto no trabalho de racionalização das Lajes é apenas um exemplo desse compromisso. Quando foram anunciadas as reduções em 2015, os líderes portugueses dirigiram-se-nos com um apelo geral: que não houvesse rescisões involuntárias dos trabalhadores portugueses da base. Ouvimos, percebemos o sentido da questão e respondemos de forma positiva. E assim não houve quaisquer saídas involuntárias. Aplicámos milhões no fundo de pensões para que os trabalhadores pudessem aceitar as indemnizações ou avançar para a reforma antecipada. Alguns ficaram e receberam formação para novas posições.

Foi um esforço tremendo que exigiu a criatividade e solidariedade de muitos. Embora ignorado pela imprensa, aquilo que tanto os militares portugueses como os americanos reconhecem é que as nossas capacidades nas Lajes e os nossos padrões de excelência se mantêm ao mesmo nível a que estavam antes da reestruturação. Isto permite aos dois países manter os seus compromissos em termos de segurança num mundo cada vez mais perigoso. Os Estados Unidos e Portugal construíram um diálogo que tem provado o nosso compromisso, mesmo em tempos menos fáceis. Sobretudo em tempos menos fáceis.

O compromisso dos Estados Unidos com Portugal é duradouro precisamente porque tem duas vias. Há setenta anos, das cinzas da devastação global e do genocídio, os Estados Unidos e Portugal tornaram-se membros da Organização do Tratado do Atlântico Norte. A NATO, tal como a UE, o FMI, o Banco Mundial e as Nações Unidas – agora dirigidas por um português – foram instituídos para resolver desafios que país nenhum ou grupo isoladamente poderiam vencer. Através da colaboração nesses fora, os Estados Unidos e Portugal contribuíram para a unidade transatlântica.

Nunca esqueceremos que o Artigo 5º, a cláusula de autodefesa da NATO, foi invocado pela primeira vez depois dos ataques do 11 de Setembro de 2001. Citando o Presidente Obama, “Mesmo perante uma transição de governos nos Estados Unidos, entre administrações Democratas e Republicanas, há um reconhecimento de que a aliança da NATO é absolutamente vital e as relações transatlânticas a pedra de toque da nossa segurança mútua e da nossa prosperidade.” Hoje e todos os dias, este compromisso reflecte-se nos sacrifícios das tropas portuguesas e americanas que, lado-a-lado, participam em operações da NATO no Afeganistão, nos Balcãs, na Europa Central e de Leste e no Iraque e também em missões da UE e da ONU no Mediterrâneo, Mali, República Centro-Africana e Somália.

A nossa aliança sobrevive a transições de governo, alterações de políticas e, sim, mesmo a uma mudança de embaixador. Uma amizade invicta só se torna madura e desenvolvida através de cada mudança que atravessa. E isto traz-me ao segundo C, cooperação.

Uma das vistas que eu e muitos outros visitantes que aqui vêm irão recordar é o icónico arco da Ponte de D. Luis que liga Porto e Vila Nova de Gaia. Sendo uma de seis sobre o rio Douro, esta ponte facilitou os laços comerciais e culturais entre as duas cidades ao longo de mais de cem anos e é um exemplo da cooperação que fez com que cada uma seguisse o seu próprio caminho de desenvolvimento. Nem sempre houve cooperação entre o Porto e Gaia mas saúdo os meus amigos, os Presidentes da Câmara das duas cidade Rui Moreira e Eduardo Rodrigues, pela sua colaboração para maior benefício económico da região. Claro que também tenho uma história. Para realçar a sua parceria, os dois presidentes acordaram há dois anos em abrir os festejos de S. João com um brinde, encontrando-se a meio da ponte, cada um vindo do seu lado. O plano era que eu acompanhava o Presidente de Gaia e depois do brinde saía com o Presidente do Porto para assistir com ele aos festejos. Bem, com as televisões a filmar e a um sinal, o Presidente Rodrigues e eu saímos de Gaia para atravessar a ponte observando o Presidente Moreira que fazia o mesmo do seu lado. Aquilo que me pareceu é que parecia tudo menos um brinde e mais uma troca de prisioneiros no Checkpoint Charlie! Mas tudo acabou bem! E o S. João é decididamente a minha festa favorita em Portugal. Também lá estive no ano passado.

Os Estados Unidos e Portugal podem não estar literalmente ligados por uma ponte, mas tenho muito orgulho em dizer que as pontes entre os nossos países cresceram significativamente nos anos recentes. Vejamos a defesa e segurança, a primeira responsabilidade de qualquer governo. Com o apoio dos Estados Unidos, Portugal foi, em 2015, palco do Trident Juncture, o maior exercício militar da NATO numa década. Esta mostra incrível juntou 36.000 militares de 30 nações aliadas e parceiras e envolveu 140 aeronaves e barcos, aumentando a capacidade da Aliança e exibindo a sua reacção.

Em Setembro passado assinalámos uma outra etapa na cooperação inter-militar quando seis Lockheed Martin F-16, inicialmente operados pela Força Aérea Portuguesa, foram transferidos para a Roménia, diminuindo assim a dependência desse país dos sistemas de armas soviéticos e aumento a interoperacionalidade e coesão da NATO. E os casos de colaboração entre as nossas chefias militares passaram de menos de 10 em 2013 para cem este ano. Isto diz muito sobre o que é a nossa colaboração na defesa.

Mas a defesa é apenas uma das áreas em que cooperamos. Eu diria que a força das relações entre os Estados Unidos e Portugal reside na sua amplitude e flexibilidade, vital para lidar com os desafios de hoje, que são transnacionais no objectivo e trans-institucionais na solução. A crise dos refugiados é um caso em análise. Em 2016, Portugal abriu o seu coração e os seus bairros aos refugiados enquanto outros na Europa levantaram muros. Esta expressão dos melhores valores da humanidade não passou despercebida, tendo sido elogiada na cimeira dos refugiados para os líderes patrocinada pelo Presidente Obama, em Setembro, em Nova Iorque. A Embaixada orgulha-se da sua pequena contribuição ao organizar o programa para líderes portugueses visitarem os Estados Unidos e contactarem com os agentes locais que já acolhem grandes grupos de refugiados.

Todos ficámos tocados pelas imagens de pobreza e desespero que têm caracterizado a crise global de imigração, mas os Estados Unidos e Portugal também apostam numa série de desafios menos visíveis mas igualmente prementes. Em Lisboa, peritos das forças policiais e civis norte-americanas trabalham com as autoridades portuguesas numa série de assuntos – desde o aumento da segurança na internet ao combate à contrafacção e narcóticos. Em Outubro, à volta de 20 juízes portugueses e americanos levaram a cabo uma troca de melhores práticas no combate ao tráfico de seres humanos, uma praga que afecta os dois países.

E aqui mesmo, no Porto, graças a uma parceria entre a NASA e a Universidade do Porto, o investigador João Tasso e a sua equipa recorrem ao uso de satélites, submarinos e drones para recolher dados oceanográficos e traçar padrões de movimentos de peixes e mamíferos com um nível de pormenor nunca alcançado antes. E as aplicações para uso na segurança marítima são inúmeras. Através desta colaboração, os cientistas de todo o mundo esperam vir a compreender as mudanças complexas que os oceanos e ambientes marítimos enfrentam.

Há um grande trabalho a ser desenvolvido todos os dias por portugueses e americanos que defendem as nossas relações a nível de política, institucional e local. Em 2014 tive o prazer de me tornar amigo de um desses indivíduos, o português-americano prémio Nobel Dr. Craig Mello. Quando o Dr. Mello veio a Portugal num missão sobre ciências da vida patrocinada pela Embaixada Americana, ele afirmou que nenhum país estava a fazer investigação em ciências da vida ao nível de Portugal. Nem um. Mas lamentou que Portugal não estivesse a comercializar ou divulgar isso de modo a que o mundo ficasse a saber que as capacidades de investigação em Coimbra ou Braga podiam competir com as de Cambridge ou Boston.

O Dr. Mello tem razão. Há aqui inovação de classe mundial e não apenas na área das ciências da vida. Portugal é líder em questões de ambiente, tendo atingido um recorde mundial em Maio passado quando o país inteiro funcionou 107 horas seguidas com energia solar, eólica e hidroeléctrica. A Windfloat, a plataforma eólica flutuante desenvolvida pela EDP e pelo seu parceiro americano Principle Power, funciona a seis quilómetros da costa no Atlântico a norte daqui, perto da Aguçadoura, local do primeiro parque de ondas do mundo.

No sector das tecnologias, a região do Porto é líder em Portugal com o maior número de startups, 36 por cento do total nacional. As startups sediadas no Porto como a Veniam ou Xhockware, que abriram escritório nos Estados Unidos com sucesso, estão a dar força à pretensão de Portugal como hub de inovação global. A esta dinâmica acresce o facto de há algumas semanas o foco do mundo tecnológico ter estado em Portugal quando o Web Summit, o maior evento do mercado da tecnologia do continente, abriu as portas a mais de 53.000 participantes e 7.000 CEOs de 166 países. A apoiar a incrível energia deste evento, a Embaixada associou-se à Microsoft e outros parceiros, como a UPTEC da Universidade do Porto, no lançamento do Journey to Web Summit Start-up Challenge. Este concurso para startups portuguesas ofereceu à startup vencedora uma oportunidade única – apresentação no Web Summit, espaço de incubadora e apoio jurídico gratuito para lançar uma entidade americana.

Um dos aspectos chave das nossas relações bilaterais são as parcerias institucionais, pois apoiam a investigação científica da próxima geração e o desenvolvimento de novas tecnologias. Algumas das melhores universidades americanas – incluindo Harvard, the Massachusetts Institute of Technology e Carnegie Mellon University – trabalham com parceiros locais continuando programas já antigos de estudos no estrangeiro e intercâmbio que inspiram a futura colaboração entre os nossos países. Uma dessas parcerias é entre a University of Texas – Austin e o Laboratório Ibérico Internacional de Nanotecnologia, INL, em Braga, o primeiro organismo europeu de investigação internacional no campo da nanociência e nanotecnologia. O INL tem cerca de 200 investigadores e 100 estudantes de doutoramento  de todo o mundo e a sua colaboração com a University of Texas-Austin e outras instituições abriu caminho à investigação de topo promovendo a comercialização da nanotecnologia para empregos e criação de riqueza. Aliás vamos trabalhar com o director do INL, Lars Montelius, que está aqui hoje, na sua próxima visita a Boston para criar e desenvolver a colaboração com outras instituições.

Desde que aqui cheguei, o número de estudantes americanos nas melhores universidades portuguesas registou um aumento de mais de 100 por cento! Com o número de jovens portugueses a estudar nos Estados Unidos a aumentar também, temos mais oportunidades de fortalecer as nossas parcerias institucionais. Este ano a Fundação Portuguesa para a Tecnologia (FCT) assinou um acordo com a Comissão Fulbright, uma organização bilateral que programa e implementa intercâmbios na área da educação, para mais 30 bolsas que irão permitir que estudantes portugueses façam, investigação e pós-graduação em universidades americanas. Para além disso, a NASA e a FCT lançaram um programa que dá aos estudantes portugueses a possibilidade de estagiarem num dos centros da NASA nos Estados Unidos.

Estas parcerias dão aos cientistas e inovadores as ferramentas de que precisam para que os seus esforços os levem mais longe. Com o nosso apoio queremos dar a conhecer os talentos dos Cristianos Ronaldos da investigação do cancro  e dos Antónios Guterres da aeronáutica. Ao darmos aos novos investigadores e líderes empresariais um palco para partilharem o seu trabalho e as suas histórias, inspiramos a próxima geração de visionários, tanto dentro dos nossos países como no mundo.

Estão a acontecer coisas interessantes e é bom que se note que nem tudo é novo. Diariamente são transaccionados através do Atlântico entre os Estados Unidos e a Europa quase 2 mil milhões de dólares em mercadorias e mil milhões em serviços. Os Estados Unidos são o quinto maior mercado exportador de Portugal e o maior parceiro comercial fora da Europa. As 130 empresas americanas a operar em Portugal dão emprego a mais de 20.000 pessoas e geram cerca de 5 mil milhões de vendas, ou seja 3% do PNB de Portugal.

A IBM, uma dessas empresas, abriu portas em Portugal em 1938. A Machine Watson Company, como se chamava na altura, fazia máquinas de escrever e tinha 24 empregados. Agora com mais de 1400, a IBM Portugal abriu há semanas em Viseu o seu novo Centro de Inovação para desenvolver soluções móveis, de cloud e cognitivas.

O mundo já percorreu um longo caminho desde as máquinas de escrever. Empresas como a Netflix ou Skype, nomes falados em nossas casas, começaram por ser ideias que se espalharam em termos de alcance e rapidez de tal forma que abalaram indústrias inteiras e inventaram um novo conjunto de opções para os consumidores. As barreiras na comunicação transatlântica foram vencidas pela tecnologia e o crescente número de ligações aéreas entre os Estados Unidos e Portugal através da United, Delta, American Airlines, TAP e SATA permitem aos potenciais investidores e parceiros dos dois países colaborarem como nunca tinha sido possível.

Isto traz-me ao terceiro C das relações entre os Estados Unidos e Portugal, o poder da conexão. Numa das viagens que fiz no ano passado ao Norte de Portugal, visitei aquela obra fantástica de engenharia que é o Túnel do Marão, o túnel mais longo da Península Ibérica. Fazendo a ligação entre o Porto e Vila Real, o túnel elimina os obstáculos que um terreno tão difícil apresentava para a abertura ao desenvolvimento das regiões do Douro e Trás-os-Montes. Isto é importante não apenas pelas dimensões do túnel, mas porque mais acesso e ligação entre as pessoas e as comunidades leva a mais ideias, mais inovação e uma maior troca comercial e cultural.

Da mesma forma, o sucesso das relações económicas entre os EUA e Portugal será medido pela nossa capacidade para reforçar o comércio e o investimento e pela nossa capacidade para proporcionar as conexões entre pessoas, ideias e informação para apoiar o crescimento de pequenas e médias empresas assim como projectos não tradicionais e de consciência social. A Comissão Europeia estima que 99.9% das empresas portuguesas são PMEs, responsáveis por mais de 80% do emprego. E cada vez mais dos esforços comerciais mais interessantes estão a ser feitos não por grandes empresas mas por indivíduos e comunidades.

O empresário luso-americano Michael Finete é apenas um dos exemplos na vanguarda da inovação comercial EUA-Portugal. Capitalizando a experiência familiar na indústria pesqueira, Michael procurou o apoio da Embaixada Americana em Lisboa e do Consulado de Ponta Delgada para o processo de lançamento da sua própria linha de produto de atum dos Açores, de captura sustentada e enlatado. Ao fazer o primeiro envio para a Colômbia, a empresa bem sucedida do Michael estabeleceu novas linhas comerciais com três países, criou emprego e apelou à consciência sobre o tratamento responsável de um dos mais preciosos recursos de Portugal.

Por vezes uma ideia fantástica pode surgir dos locais menos esperados. Devem conhecer o incrível projecto Alqueva Dark Sky no Alentejo, uma criação de Apolónia Rodrigues. Ela viu na zona pobre e pouco desenvolvida do Alqueva um recurso único e a custo zero — um dos céus nocturnos mais escuros da Europa — e juntou donos de hotéis, políticos locais e outros para obter a certificação Starlight Tourism e transformar a zona num destino para astrónomos, observadores das estrelas e curiosos de todo o mundo.

As histórias do Michael e da Apolónia lembram-me uma outra afirmação do Presidente Obama, “A mudança acontece porque pessoas ordinárias fazem coisas extraordinárias.”

Acrescentaria que por vezes basta o apoio duma comunidade para tornar realidade todo o potencial de uma ideia extraordinária. É por essa razão que um dos pilares essenciais da relação EUA-Portugal está na reunião e ligação entre indivíduos para permitir os laços entre pessoas que conduzem a uma mudança positiva.

O Connect to Success, o programa de bandeira da Embaixada Americana na área do empreendedorismo feminino, pretende desbloquear o potencial económico das mulheres empresárias exactamente desta forma. O programa compreende uma parte de corporate mentoring, workshops práticos e um programa de consultoria MBA/Masters que teve como primeira instituição participante a Porto Business School

Com efeito, foi através do Connect to Success que Emilia Simões, CEO da plataforma de bilheteria digital Last2Ticket — uma empresa que foi fundada aqui no Parque de Ciência e Tecnologia da Universidade do Porto, esteve entre as 1000 empresárias e investidores convidados pelo Presidente Obama para participar no 2015 Global Entrepreneurship Summit organizado pelo governo.

O Connect to Succes espalhou-se do Porto a Portimão e tem uma rede de mais de 750 mulheres. Aliás, o modelo Connect to Success tem-se revelado tão eficaz que estamos actualmente em negociações para o levar para outros países onde pode chegar a uma rede ainda mais vasta de empresárias pelo poder da conexão.

Ao cobrir os três Cs das relações EUA-Portugal — compromisso, cooperação e conexão – tocámos em assuntos que foram desde a NATO até à pesca sustentável. Não é um acaso. A nossa aliança é tão diversa e multifacetada como duradoura. Isso manifesta-se tão profundamente em zonas rurais do Afeganistão no serviço prestado por militares americanos e portugueses como nos laboratórios onde os nossos cientistas desenvolvem investigação em conjunto. Também vemos isso nos encontros entre as nossas figuras políticas de alto nível e no extraordinário número de parcerias de cidades geminadas que criaram amizades que se estendem de Honolulu, no Havai ao Funchal, na Madeira. E desde participar em intercâmbios linguísticos a ser voluntário em festivais culturais promovendo a compreensão mútua, cada um de nós tem um papel a desempenhar no reforço destes laços.

Vou embora deste maravilhoso país no dia 20 de Janeiro. A única coisa que lamento? Não poder ficar aqui mais um bocadinho. O tempo para mais uma visita a uma incubadora tecnológica, um exercício militar ou, aparentemente calma mas na realidade vibrante, a uma aldeia. O tempo para empurrar uma última iniciativa bilateral. Mas é tempo de passar o leme ao meu sucessor. Gostaria por isso de, ao terminar, pedir-vos que se tornem o quarto, crítico C da relação bilateral — catalisador de uma mudança positiva. São as vossas acções, as vossas relações e a vossa ilimitada ambição e optimismo que podem aprofundar esta relação e expandi-la por águas desconhecidas para novos horizontes, muito na linha do que os vossos intrépidos exploradores fizeram há meio milénio. Por isso vos peço… não esperem pela mudança. Vocês são a mudança. Não há nada que os portugueses não consigam. Foi a maior honra da minha vida representar os Estados Unidos neste grande país.

Estou-vos grato pelo calor e simpatia. Até breve!